As principais crises do Brasil são a financeira e a social’
    Celso Furtado (adaptado por JT Cordeiro)

 

 

A aspiração ao desenvolvimento e a Falta de solidariedade das elites
 

É surpreendente a pobreza dos diagnósticos que se realizam no Brasil sobre a situação financeira do governo e sobre a inflação brasileira. Há uma aspiração de desenvolvimento no Brasil. As elites, a classe popular, o país inteiro aspira a ser o primeiro não somente no futebol, mas em tudo. Mas nunca houve um entendimento no Brasil sobre como pagar isso.

 

 Pelo contrário, houve sempre desentendimento completo, porque particularmente as classes dirigentes, poderosas, ricas nunca tiveram um sentimento de solidariedade para com o resto da população quando se trata desse problema de desenvolvimento.

 

O déficit fiscal, que está na raiz da inflação brasileira crônica ,histórica ,veio do império. Mas o que houve depois? Veio a construção e operação de Brasília. Isso se fez sem um plano financeiro. Que país empreende uma coisa tão fantástica como construir uma cidade a 1000 Km de distancia de tudo sem Ter um plano financeiro, sem saber qual vai ser a repercussão sobre a economia, sobre a sociedade ,de onde vai tirar os recursos? Isso se fez no Brasil.

 

Aspiração ao desenvolvimento, aqui é paradigmático, a aspiração ao desenvolvimento está na natureza do brasileiro. Você vai num país como a Argentina e pouca gente na gente lá. Na América Latina em geral , ninguém tem uma opinião tão otimista sobre seu próprio país como tem o Brasil.

 

- Como o país tem muitas responsabilidades, todos nós perguntamos porque este país é pobre. Já contei o meu choque quando percebi que o Brasil é muito mais pobre do que os outros países da América Latina? Quando fui para a CEPAL e manipulei estatísticas da América Latina, observei que o Brasil é um dos países mais pobres da América Latina, tendo tantos recursos. Do passado ,temos então o ponto de partida, o desejo de aproveitar o potencial que se tem e a certeza de que poderia ser muito mais desenvolvido se tivesse outra política ou outra classe dirigente. E pôr outro lado à realidade nua e crua, que é que não se têm meios para isso. Fazemos os planos de desenvolvimento, mas não conseguimos ter meios para financiá-los. A coisa sempre esbarrou aí.

 

A falta de solidariedade está no ‘vamos financiar endividando o país’. Não houve jamais uma decisão de financiar o desenvolvimento com recursos próprios, votando no Orçamento um plano. Eu vivi na França, o Parlamento discute um plano completo de financiamento, de onde virão os recursos. Aqui não. Brasília foi construída com que plano de financiamento? Quem discutiu isso? Eu perguntei isso na época de Juscelino e ninguém sabia, nunca tinha sido feito um plano para financiar Brasília.

 

É um traço da sociedade brasileira que traduz um profundo egoísmo daqueles que têm o que mais os beneficiam do desenvolvimento. Seria de imaginar que para desenvolver um país como o Brasil algumas gerações teriam que se sacrificar. Os recursos acumulados seriam para financiar esse desenvolvimento e isso não foi feito. Houve no Brasil falta de consciência sobre a gravidade do problema do financiamento. É o que se chama aqui de crise fiscal.

 

A estrutura social do Brasil é muito peculiar. Não existe nenhum país onde à distância entre o salário mínimo e a renda média do país seja tão grande quanto no Brasil. Mas, no comportamento das elites com respeito a financiar um esforço importante, como seria o controle da inflação, a gente sente perfeitamente que não há espírito de colaboração. Todo mundo está de acordo em que há um desequilíbrio fiscal profundo no Brasil. Mas quem está de acordo em aumentar a carga fiscal?

 

 

Interpretação do texto:


1. Como o autor analisa nosso desejo de desenvolvimento?


2. O que impede na pratica nosso desenvolvimento.


3. Como o autor analisa a construção de Brasília?


4. Por que o autor afirma que não há solidariedade das classes ricas para com os pobres?


5. Como o autor vê nossos dirigentes?