A Revolução Americana

José Tadeu Cordeiro

 

Às lutas políticas e religiosas na Inglaterra, durante os séculos XVI e XVII, marcam a origem do movimento migratório em direção a América. No início do século XII, quando os puritanos hostilizaram a política de James I (1603-1625) e, passaram a ser perseguidos e humilhados pela monarquia absolutista, muitos deixaram a Inglaterra e a Irlanda e, emigraram para a América.

 

Os combatentes na Inglaterra, católicos, anglicanos, presbiterianos e puritanos, formam o contingente migratório que, apesar de viverem em guerra na Europa, acabam construindo outra civilização na América, em que as lutas religiosas ficam para trás.

 

A região temperada, que recebeu o nome de Nova Inglaterra, foi o local para onde se dirigiram os imigrantes britânicos, fundando ali a colônia de Massachussets, em 1620. A partir da Nova Inglaterra, iniciou-se a colonização do que ficou conhecido com as 13 colônias americanas, e que foi a origem da nação norte-americana, hoje EUA.

 

O processo de povoamento foi muito lento e desigual, o que ainda em meados do século XVIII, impede-nos de pensar num todo, com características homogêneas.

 

As relações das colônias americanas com a Metrópole (Inglaterra) preservaram certa independência, mais de fato do que de direito. Enquanto nas colônias do Norte seguiu-se uma exploração econômica que se baseou na pequena propriedade agrícola, no trabalho livre e no artesanato urbano – colonização de povoamento -, nas colônias do Sul, a colonização baseou-se na grande propriedade, no trabalho escravo e no estreitamento das relações com a Metrópole – colonização de exploração.

 

Com certa liberdade, as colônias do Norte aumentaram a produção artesanal, principalmente da indústria ligada a pesca e a construção naval. Rapidamente aproveitaram os excedentes, (manufaturas e alimentos) para trocá-los com a América Central, onde se abasteciam de açúcar e de rum, que eram trocados na África, que lhes forneciam escravos (destinados à América Central e as colônias do Sul). Dando origem ao conhecido comércio triangular.

 

A guerra anglo-francesa travada em torno de territórios, na América (1656-1663?) viria alterar essa quase independência das colônias americanas. Os ingleses acreditavam que o custo da guerra, anglo-francesa deveria ser repartido com os colonos americanos. Para isso procurou centralizar a administração colonial e, iniciou um processo de endurecimento nas relações econômicas, que na prática procurou eliminar a quase independência comercial da colônia e enquadra-la no Pacto Colonial.

 

Entre as medidas (Leis Intoleráveis), adotadas pela Metrópole estão: 1ª A declaração de 1763, que proibia a expansão da Colônia rumo ao Oeste; 2ª A lei do açúcar (1764) que elevava a taxa alfandegária sobre o açúcar que não procedesse das Antilhas britânicas; 3ª a lei do selo (1765) determinava o uso do selo em qualquer documento legal da Colônia (a lei foi revogada em função de fortes manifestações contrárias, na colônia); 4ª a lei Towshend (1767), que taxava alguns produtos de consumo colonial, com a intenção de evitar o comércio intercolonial; e, 5ª a lei do Chá (1773), concedeu o monopólio da exploração do chá a Cia. Das Índias Orientais, prejudicando os comerciantes locais.

 

Em Boston (Massachussets) constituiu-se um núcleo inicial de resistência a essas medidas, que concentra tanta tensão, que se transforma numa autoridade rival à da Metrópole e, a força a enviar a América, uma tropa adicional, como reforço.

 

A tensão não reduzirá com o tempo, pelo contrário, incidentes violentos de ruas faz com que a oposição se estenda a outras colônias, criando uma resistência ao que consideram uma intervenção indevida da Metrópole, na vida dos colonos.

Os acontecimentos se precipitam com a nova taxa sobre o chá, de 1773 (na verdade, a concessão do monopólio a Cia das Índias Orientais). Em todas as colônias houve manifestações contrárias à medida, mas é em Boston, que as ações tornam efetivas, com parte da população, disfarçada de indígenas, jogam 18 mil libras de chá ao mar (episódio conhecido como The Boston Tea Party, ou Festa do Chá em Boston).

 

A Inglaterra exigirá o reembolso do chá, o julgamento dos culpados na Metrópole, fechará o Porto de Boston. Medidas de força, inúteis, porque Boston e as demais colônias tomam consciência de sua força e dos seus interesses.

 

O conflito passa para as armas, e a 19 de abril de 1775, em Lexington, é travada a primeira batalha. No início, o despreparo das forças coloniais leva-as a várias derrotas, mas à medida que vão se reorganizando, ajudadas pelos abusos das tropas inglesas diante dos colonos “independentes”, surgirá à tomada de consciência, cada vez mais clara, de que os interesses dos colonos americanos não são os mesmos que os  metropolitanos, e,  essa consciência os levará à Declaração de Independência, a 04 de julho de 1776, verdadeiro ato de nascimento dos Estados Unidos da América.

 

A independência americana deve ser visto como um longo processo, onde o soldado inglês, tem pouco entusiasmo pela luta e, a própria classe dominante britânica tem interesse num desfecho rápido da guerra, uma parte da classe dirigente não quer uma radicalização do conflito militar, para não perder a simpatia que ainda tinha e não perder o comércio que mantinham com a América do Norte.

 

A rendição britânica ocorreu após a derrota na batalha de Yorktow, em 19 de outubro de 1781. O reconhecimento da Independência americana se dá com o Tratado de Versalhes (1783), falta no entanto dar forma a esta grande nação.

 

O ato inicial é a convocação de uma Convenção, responsável pela elaboração da  Constituição, cuja promulgação ocorreu em 17 de setembro de 1787. Na prática, a Constituição americana consagra as idéias iluministas, e será lembrada como a primeira República moderna que soube eleger um Contrato Social, que consentia aos contratantes a igualdade e a possibilidade de expressarem-se com ampla liberdade.

Os homens que, primeiramente assumiram a tarefa de transformar os atos constituintes em instrumentos concretos de vida cotidiana são, em grande parte, os mesmos que, com armas e idéias, contribuíram para a liberdade e identidade nacionais.

 

Um começo lento e difícil, mas lentamente os passos programados são cumpridos. Inicia-se a expansão para o Continente (Meio-Oeste e Oeste), com o espantoso genocídio das nações indígenas.

 

Uma terrível e velha contradição permaneceu a marcar a vida americana: como conciliar os princípios democráticos de liberdade e igualdade com a permanência de um grande número de escravos negros? Esta contradição explodirá na guerra de Secessão (1861-1865), que foi  uma espécie de encerramento da revolução do século  XVIII.

 

O fim da guerra, que propiciou a libertação dos escravos, não resolveu os problemas da população negra americana, mas abriu caminho para que, através de um processo dialético, longo e complicado, se buscasse o sentido de nacionalidade americana. Esse processo dialético se manifesta, sobretudo, através de uma extraordinária difusão da palavra, do debate, do confronto e choque de idéias. A sede mais significativa deste processo será o Congresso, mais ele se alimentará nas ruas, das idéias e dos interesses dos cidadãos comuns.

 

JT Cordeiro, baseou-se em Carlos e Kátia Alzugaray, A Revolução Americana, Editora Três, 1982.