Estilhaço do apocalipse
   Fragmento de astro que matou os dinossauros é dragado das profundezas do oceano Pacífico. O astro tinha as dimensões do monte Everest, mas virou pó ao se chocar com a Terra a 30 km/s

    A teoria de que os dinossauros extinguiram-se há 65 milhões de anos aniquilados pelo choque de um asteróide ou de um cometa de dez quilômetros de diâmetro parece ter migrado do plano das hipóteses para o terreno das verdades científicas. Tudo por causa de um pedrisco de 2,5 milímetros, pouco maior que um grão de areia. Se tamanho fosse documento, o achado dos pesquisadores do Instituto de Geofísica e Física Planetária da Universidade da Califórnia não estaria na capa da revista Nature. É que esse cisco metálico carrega um terrível estigma: é um estilhaço do corpo celeste responsável pela virada de uma página na história da vida no planeta. O fragmento foi dragado das profundezas do oceano Pacífico, num ponto nove mil quilômetros a oeste da península mexicana do Yucatán. É ali que estão os restos soterrados de uma cratera de 180 quilômetros de diâmetro. Seu nome é impronunciável: Chicxulub. Acredita-se que seja onde caiu a megaestrela cadente.

    Detectado o local da queda, para provar a teoria faltava achar uma porção do astro. Apesar de originalmente ter as dimensões do monte Everest, ele pulverizou-se ao impactar contra a superfície à velocidade de 30 quilômetros por segundo (150 vezes maior que a de um Jumbo 747). A explosão resultante ergueu uma nuvem de pó que encobriu a atmosfera. Isso esfriou a temperatura da Terra e matou os dinossauros que sobravam. Se fragmentos restaram, teriam de ser pequenos, como o grão do Pacífico.

    O fato de ele ter sido içado do fundo do mar de uma região distante da cratera de Yucatán reafirma a teoria da extinção por um cometa, proposta em 1981 por dois cientistas da Universidade da Califórnia em Berkeley, o físico ganhador do Nobel de 1968 Luis Alvarez (1911-88) e seu filho, o geólogo Walter Alvarez. Eles chegaram à conclusão estudando o subsolo do planeta. O solo que pisamos pode ser comparado às camadas de um bolo. Quanto mais fundo se cava, mais antigo é o sedimento retirado. Fósseis de dinossauros são achados nos extratos iguais ou anteriores há 65 milhões de anos, enquanto nos mais recentes escavam-se restos de mamíferos como mamutes – mas nenhum dinossauro. Infere-se daí que os répteis do passado viveram até 65 milhões de anos atrás, sendo essa data conhecida como a limítrofe entre os períodos Cretáceo, dominado pelos tiranossauros, e Terciário, onde o topo da cadeia alimentar é ocupado pelos mamíferos. Ao estudar a faixa limítrofe, os Alvarez detectaram proporções anormais de irídio, elemento químico raro na Terra, mas comum no espaço. Como a mesma anomalia se repetia em depósitos da mesma idade ao redor do planeta, concluiu-se que o irídio teria se espalhado numa nuvem de material pulverizado, cuja origem só poderia ser sideral, de um cometa ou de um asteróide.

    Foi detectando uma concentração ainda maior de irídio nos depósitos de 65 milhões de anos do fundo do Pacífico que os geólogos californianos identificaram o fragmento. Sua composição química denuncia-o como extraterrestre. Nunca se poderá provar sem sombra de dúvidas que pertenceu ao cometa responsável pelo extermínio de 90% das formas de vida existentes no fim do período Cretáceo. Mas esse pedrisco é, de longe, o melhor candidato jamais encontrado para esse papel.