Os bancos anêmicos

    Nos Estados Unidos e na Europa, a quantidade de gente que doa sangue está caindo, em média, 5% ao ano. No Japão, a situação e pior: a queda é de aproximadamente 7%. Ninguém sabe ao certo por que está havendo queda nas doações, mas a explicação deve ser o medo ao contágio. "No Brasil não sabemos se isso está acontecendo porém é provável", diz o hematologista mineiro Hélio Moraes de Souza, que em outubro do ano passado se mudou para Brasília para estar à frente da Coordenadoria de Sangue e Hemode rivados (COSAH) do Ministério da Saude. Uma de suas metas é botar ordem na casa. Até hoje o governo só tem (alguma) noção sobre o volume e a qualidade do sangue na rede pública, deixando de contabilizar os hospitais privados. Sem um retrato dos bancos de sangue em geral, não se sabe se a oferta aqui está caindo, como no resto do mundo. Enquanto existe cada vez menos sangue disponível, cada vez mais pacientes necessitam de transfusões. "E uma conseqüência da evolução da Medicina". explica o hematologista Marcelo Cliquet, da Fundação Pró-Sangue de São Paulo. "Alguns tratamentos de câncer destroem a medula óssea, que fabrica as células sanguíneas, e, até ela se recuperar, a pessoa vai precisar de dez unidades de sangue diárias durante vinte dias", exemplifica. Uma unidade de sangue tem 480 mililitros e corresponde àquele saquinho que se enche durante uma doação. Feitas as contas, um único paciente de câncer pode nescessitar, nesse período, de duzentos doadores. Por motivos como esse, o mundo precisa de 7,5 milhões de litros de sangue a mais por ano e, se continuar assim, por volta do ano 2020 vão faltar 9 milhões de litros em seu estoque. Diante desse quadro anêmico, o sangue artificial seria a salvação. "Além de não oferecer risco de contaminação, o sangue artificial seria abundante", diz o imunologista Peter Collins, da agência do governo americano que controla a busca de novos tratamentos, a FDA (Food and Drug Administration. "Temos só duas décadas para evitar uma calamidade", conclui. Para apressar uma solução, os americanos passaram a testar em seres humanos seis fórmulas que ainda apresentam problemas. Uma delas, transparente, usa o PFC do ra to mergulhador dos anos 60 e é a que menos chance tem de vencer a parada, por ser tóxica. As outras cinco, do branco azulado à cor de ferrugem, são à base de hemoglobina. Acontece que essa é uma molécula que, por enquanto, só trabalha direito quando está no sangue de verdade.

    A hemoglobina não suporta ficar sem a capa protetora do glóbulo vermelho

    Para levar o oxigênio da respiração pelo corpo em cada glóbulos vermelhos existem 250 milhões de moléculas de hemoglobina. No pulmão, que é presurizado, cada hemoglobina agarra quatro moléculas de oxigênio. Nos outros tecidos, como a pressão é menor, essas moléculas são liberadas.

    A hemoglobina percebe a diferença de pressão, agarrando ou soltando o gás, graças a enzimas que existem dentro do glóbulo de sangue, conhecidas por elas dentro do glóbulo, a hemoglobina perde eficácia.

    Quatro em um

    O sangue doado por um indivíduo serve para quatro doentes.

    Uma gota de sangue é a primeira prova. Se for pálida, o candidato a doador será dispensado por estar anêmico. Se está aparentemente saudável, é jovem e não pertence a grupos de risco de doenças como a Aids, o indivíduo pode doar uma unidade, ou seja, uma bolsa de 480 mililitros de sangue.

    Uma seringa do sangue colhido é usada para investigar treze doencas, entre elas a Aids, as hepatites B e C e o mal de Chagas.

    O sangue ainda deve passar por outros exames, para saber se ele tem uma proteína chamada A ou uma proteína chamada B ou as duas, sendo do tipo AB. Se não tiver nenhuma delas será tipo O. Qualquer um desses Tipos sanguineos pode conter ainda outra proteína, a Rh, sendo então rotulado de positivo. Se não tiver a proteína Rh, será negativo.

    Devidamente classificado, o sangue é centrifugado. As células vermelhas e brancas são mais pesadas e ficam no fundo Elas são separadas do restante.

    O líquido amarelado que sobrou é centrifugado de novo. Agora as plaquetas, que ficam no fundo, vão ser retiradas.

    O que sobra é o plasma e ele é congelado. Ao sair do freezer, fica com uma casquinha esbranquiçada formada pelos chamados fatores de coagulação.

    Os fatores de coagulação são separados do plasma. Com isso, uma única bolsa de sangue pode ser usada por quatro pacientes com necessidades diferentes. glóbulos vermelhos, plaquetas, fatores de coagulação e plasma.

    Nos bancos de sangue, os glóbulos vermelhos não duram mais do que 42 dias.

   A mais complexa das misturas

    Veja do que são constituídos os 5 litros de sangue do corpo humano

    Água

    É o solvente de todas as substância carregadas pela circulação.

    Sais

    O sódio, o potássio e outros minerais são como válvulas que regulam a entrada de substâncias nas células do corpo.

    Proteínas plasmáticas

    São três tipos. A albumina ajuda a regular as trocas de substâncias entre as células. O fibrinogênio participa da formação dos coágulos. E os anticorpos ajudam a destruir micróbios nocivos.

    Glóbulos brancos

    Responsáveis pela defesa do organismo, existem 5.000 a 10.000 deles em uma gota de 1 milímetro cúbico de sangue. Sua função é insubstituível e, por isso, nenhum sangue artificial é capaz de evitar infecções.

    Glóbulos vermelhos

    Existem 5 a 6 milhões deles em uma gota de 1 milímetro cúbico de sangue. Sua função é transportada os gases da respiração. O que se entende por sangue artificial quer suprir o papel desses glóbulos.

    Outras substâncias

    Os hormônios, os nutrientes da alimentação, o colesterol, assim como todo o lixo produzido pelas células do corpo, navegam pelo sangue. Os testes com sangues artificiais levam isso em conta. Afinal, não basta conseguir transportar o oxigênio direito. Os cientistas querem saber se o sangue de laboratório não atrapalharia o transporte de todo o resto.

    Plaquetas

    Células responsáveis pela coagulação, elas ainda não são imitadas em laboratório, Existem entre 250.000 e 400.000 plaquetas em 1 milímetro cúbico de sangue. O máximo que os médicos conseguem é extrair as moléculas que elas produzem, chamadas fatores de coagulação, para transformá-las em pó. Desse jeito, usando fatores de coagulação processados industrialmente, pacientes como os hemofílicos, que padecem da falta dessas moléculas, podem abrir mão das transfusões. Isso, aliás, já vem sendo feito.