Qual a origem da epidemia de HIV/AIDS ?

    A Sindrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) foi reconhecida em meados de 1981, nos EUA, a partir da identificação de um número elevado de pacientes adultos do sexo masculino, homossexuais e moradores de São Francisco ou Nova York, que apresentavam sarcoma de Kaposi, pneumonia por Pneumocystis carinii e comprometimento do sistema imune. Todos estes fatos convergiram para a inferência de que se tratava de uma nova doença, ainda não classificada, de etiologia provavelmente infecciosa e transmissível. Em 1983 o agente etimológico foi identificado: tratava-se de um retrovírus humano, atualmente denominado vírus da Imunodeficiência humana, HIV-1, que anteriormente foi denominado LAV e HTLV-III. Em 1986 foi identificado um segundo agente etimológico, também retrovírus, estreitamente relacionado ao HIV-1, denominado HIV-2. Embora não se saiba ao certo qual a origem dos HIV-1 e 2 sabe-se que uma grande família de retrovírus relacionados a eles está presente em primatas não-humanos na África sub-Sahariana. Todos os membros desta família de retrovírus possuem estrutura genômica semelhante, apresentando homologia em torno de 50%. Além disso todos têm a capacidade de infectar linfócitos através do receptor CD4. Aparentemente o HIV-1 e o HIV-2 passaram a infectar o homem há várias décadas. O HIV-1 tem se mostrado mais virulento do que o HIV-2. numerosos retrovírus de primatas não-humanos encontrados na África têm mostrado grande similaridade com o HIV-1 e com o HIV-2. O vírus da Imunodeficiência símia (SIV) presente com muita freqüência nos macacos verdes africanos é muito próximo ao HIV-2, sugerindo que ambos evoluíram de uma origem comum. Por estes fatos supõe-se que o HIV tenha origem geográfica africana e que sua disseminação se deve às características da sociedade contemporânea.

    Quais as formas de transmissão do HIV?

    As principais formas de transmissão do HIV são: sexual, por relações homo e heterossexuais; sangüínea, em receptores de sangue ou hemoderivados e em UDIV; e perinatal, abrangendo a transmissão da mãe para o filho durante a gestação, parto ou por aleitamento materno. Além destas formas mais freqüentes há também a transmissão ocupacional, por acidente de trabalho em profissionais da área da saúde que sofrem ferimentos pérfuro-cortantes contaminados com sangue de pacientes com infecção pelo HIV e, finalmente, há oito casos descritos na literatura de transmissão intradomiciliar nos quais não houve contato sexual nem exposição sangüínea pelas vias classicamente descritas.

    A principal forma de exposição no mundo todo é a sexual, sendo que a transmissão heterossexual através de relações sem o uso de preservativo é considerada, pela OMS, como a mais freqüente do ponto de vista global. Na África sub-Sahariana é a principal forma de transmissão. Nos países desenvolvidos a exposição ao HIV por relações homossexuais ainda é a responsável pelo maior número de casos, embora as relações heterossexuais estejam aumentando de importância na dinâmica da epidemia. Os fatores que aumentam o risco de transmissão do HIV numa relação heterossexual são: alta viremia ou Imunodeficiência avançada; relação anal receptiva; relação sexual durante a menstruação; e concomitância de doenças sexualmente transmitidas, principalmente das ulcerativas. Sabe-se hoje que as úlceras resultantes de infecções como cancróide, sífilis, e herpes simples amplificam a transmissão do HIV.

    A transmissão sangüínea associada ao uso de drogas IV é um meio muito eficaz de transmissão do HIV devido ao uso compartilhado de seringas e agulhas. Esta forma tem importância crescente em várias partes do mundo, como na Ásia, América Latina e no Caribe. Nos países industrializados também tem sido crescente a transmissão pelo uso de drogas IV, sendo que em alguns países como na Espanha já é a primeira causa de exposição ao HIV.

    A transmissão através da transfusão de sangue e derivados tem apresentado importância decrescente nos países industrializados e naqueles que adotaram medidas de controle da qualidade do sangue utilizado, como é o caso do Brasil. A utilização de seringas e agulhas não descartáveis e não esterilizadas foi responsável por muitos casos no mundo todo, sendo que o episódio mais dramático ocorreu na Romênia, causando verdadeira epidemia de AIDS pediátrica.

    A transmissão perinatal, decorrente da exposição da criança durante a gestação, parto ou aleitamento materno vem aumentando devido à maior transmissão heterossexual. Na África são encontradas as maiores taxas desta forma de infecção pelo HIV, de 30 a 40%, enquanto em outras partes do mundo, como na América do Norte e Europa se situam em tomo de 15 a 29%. Os motivos desta diferença devem-se ao fato de que naquele continente a transmissão heterossexual é mais intensa e também ao aleitamento materno, muito mais freqüente do que nos países industrializados.

    A transmissão ocupacional ocorre quando profissionais da área da saúde sofrem ferimentos pérfuro-cortantes contaminados com sangue de pacientes soropositivos para o HIV. Estima-se que o risco de contrair o HIV após uma exposição percutânea a sangue contaminado seja de aproximadamente O,3%. Os fatores de risco já identificados como favorecedores deste tipo de contaminação são: a profundidade e extensão do ferimento a presença de sangue contaminante visível no instrumento que produziu o ferimento o procedimento que resultou na exposição envolver agulha colocada diretamente na veia ou artéria de paciente HIV+; e, finalmente, o paciente fonte da infecção ser terminal. O uso da zidovudina após a exposição aparentemente reduz a chance de transmissão do HIV.

    Nos casos intradomiciliares relatados, a transmissão foi atribuída, em seis pacientes, ao contato com sangue do paciente fonte. Em um caso a contaminação se deu após contato repetido com excretas e em um caso não foi estabelecida a via de infecção. A possibilidade deste tipo de transmissão implica na orientação rigorosa dos contatantes intradomiciliares quanto aos cuidados e precauções necessários no manuseio adequado de materiais contaminados com sangue, secreções e excretas e também quanto ao descarte de materiais pérfuro-cortantes em recipientes rígidos, além da necessidade de manutenção de hábitos de higiene.

    É certo que a transmissão por contato casual não ocorre?

    Os meios alternativos de transmissão propostos incluem contato interpessoal não-sexual e não-percutâneo, também referido como contato casual, vetores artrópodes, fontes ambientais (aerossóis por exemplo) e objetos inanimados (fômites), além de instalações sanitárias.

    Até o momento não foi possível evidenciar com segurança nenhum caso de infecção por HIV adquirido por qualquer destas vias teóricas de transmissão.

    A investigação de 956 indivíduos co-habitantes de pacientes com AIDS, que freqüentemente compartilhavam objetos como copos, talheres, pratos, cortadores de unhas, pentes, toalhas, roupas, e facilidades domésticas como cozinha e banheiro; e referiam contato íntimo e freqüente incluindo beijos, abraços e cuidados de enfermagem não evidenciou nenhuma soroconversão resultante destas atividades.

    Vale ressaltar que há seis casos descritos na literatura em que a soroconversão foi atribuída aos contatos intradomiciliares.

    Há raros relatos anedóticos de hipotética transmissão horizontal do HIV, porém estes não resistem a uma análise mais cuidadosa e as evidências são insuficientes para caracterizar formas não-tradicionais de transmissão.

    Dados laboratoriais e epidemiológicos não provêm qualquer suporte à possibilidade teórica de transmissão por artrópodes atuando como vetores biológicos ou mecânicos. Não foi possível evidenciar qualquer multiplicação do HIV em artrópodes após inoculação intra abdominal, intratorácica ou após repasto de sangue infectado. Outros estudos mostraram ausência de replicação do HIV em linhagens celulares derivadas de artrópodes.

    Estudos epidemiológicos nos Estados Unidos, Haiti e África Central não mostraram qualquer evidência de transmissão por vetores.

    Conclui-se que formas alternativas de transmissão são altamente improváveis e que a experiência cumulativa é suficientemente ampla para se assegurar enfaticamente que não há qualquer justificativa para restringir a participação de indivíduos infectados de seus ambientes domésticos, escolares ou profissionais.

    Os dados disponíveis permitem aos profissionais de saúde assegurar suas comunidades de que não há ameaça neste sentido.