Penicilina, uma revolução na medicina

    Precursor dos antibióticos, germicida passou a curar doenças que até então levavam à morte

    Um dos símbolos do século 20, a penicilina representou uma revolução na medicina mundial e prolongou a vida humana em cerca de 10 anos. Considerado o precursor da era dos antibióticos, o poderoso germicida foi descoberto em 1928, pelo bacteriologista Alexander Fleming.

    Nascido em Darvel, na Escócia, Fleming fez seu curso na escola de medicina do Saint Mary’s Hospital, na Universidade de Londres, e descobriu a penicilina por acaso, ao ver que uma pequena porção de mofo caído da tampa de uma placa de cultura, em seu laboratório, impediu a proliferação das bactérias ao redor. O escocês foi o primeiro bacteriologista a relatar o poder germicida do mofo verde Penicillium notatum, do qual a penicilina - o menos tóxico e o mais usado dos antibióticos - foi extraída pela primeira vez, por um processo de purificação.

    A penicilina trouxe ao mundo a possibilidade de curar doenças que até então levavam à morte, como pneumonia, meningite, gonorréia, peste, cólera, sífilis e difteria, entre outras. A penicilina impede a produção das moléculas de carbono que formam a membrana da bactéria. Quando esta se divide, sua parede vai ficando cada vez mais fina, até estourar, deixando escapar o citoplasma do interior. Em 1897, Ernest Duchesne, um jovem estudante de Lyon, chegou perto da descoberta de Fleming: ele relatou a cura de camundongos com um penicillium extraído do mofo. Apesar do feito, Duchesne passou pela História sem ser notado.

    Já Alexander Fleming anunciou sua descoberta à Imprensa em 1929. Sem muita atenção dos meios de comunicação, o bacteriologista viu-se diante da dificuldade de provar a importância da penicilina. Obcecado por sua teoria, passou a comprar qualquer objeto mofado para testá-la - até mesmo galochas velhas e trapos de guarda-chuva, o que o transformou em objeto de chacota.

    Anos mais tarde, no entanto, o escocês retomou as pesquisas e, com a ajuda do australiano Howard Florey e do alemão naturalizado inglês Ernst Boris Chain, conseguiu obter um grama de penicilina pura. A persistência foi recompensada: Fleming recebeu o título de sir do rei Jorge VI e, com os colegas Florey e Chain, ganhou o Prêmio Nobel de Medicina de 1945, pela descoberta e aplicação do antibiótico.

    Durante a Segunda Guerra Mundial, num cenário de destruição e mortes, a penicilina passou a ser usada para salvar os soldados feridos. O novo antibiótico chegou à França em 1945, mas era escasso na Europa, fato relatado no filme O Terceiro Homem, de Carol Red, que mostra o mercado negro como meio utilizado para obter a substância.

    O grande desafio era produzir a penicilina em maior quantidade. Para surpresa de muitos, a primeira fonte capaz de fornecer penicillium suficiente foram os melões podres, descoberta feita em Peoria, Illinois, nos Estados Unidos, que abriu as portas para a produção industrial em larga escala no país, em 1943.

    Atualmente, os fungos e bactérias são cultivados em grandes tanques fechados, com capacidade de 20 mil a 110 mil litros, onde é injetado ar estéril (desprovido de germes). Quando este processo chega ao fim, o que leva cerca de três dias, o antibiótico é concentrado, purificado e testado, de acordo com as normas impostas pelo governo.

    Setenta e um anos após a descoberta, muitas mudanças ocorreram. A penicilina tornou-se um produto de fácil acesso e muitas pessoas passaram a usá-la exageradamente. Os perigos do excesso são os efeitos colaterais: o organismo fica desequilibrado e o antibiótico mata não só o germe patogênico, mas também a flora intestinal e outros microorganismos essenciais ao corpo.

    Os brasileiros - que conheceram a penicilina no fim da década de 40 - são grandes consumidores de antibióticos. De acordo com a Associação Brasileira da Indústria Farmacêutica (Abifarma), só em 1998 foram vendidas, no país, 32 milhões de caixas, gerando um lucro de US$ 385 milhões.