Berçários de cometas

    José Reis

    O astrônomo Jan Hendrik Oort propôs em 1950 uma teoria sobre a origem dos cometas admitida pela quase totalidade dos especialistas. Baseou-se ele na análise estatística de órbitas cometárias, trabalho verdadeiramente gigantesco. Oort concluiu que imensa nuvem devia envolver o Sistema Solar como espessa cápsula entre 20 mil e 150 mil unidades astronômicas (UA) do Sol. Unidade astronômica é a distância da Terra ao Sol e corresponde a 149.504.200 km. Estudos posteriores e recentes de Marsden reduziram a distância de 150 mil UA no que diz respeito à camada mais externa da cápsula. Isso significa que a faixa de Oort iria de 20 mil a 50 mil UA.
    A nuvem de Oort foi concebida como vasto reservatório de cometas, cerca de 100 bilhões, totalizando massa correspondente a dez vezes a da Terra. Desse enxame de cometas que descrevem órbitas quase circulares em torno do Sol, apenas 1 em 100 mil atinge as proximidades do Sol, em consequência de perturbações vindas de estrelas mais próximas.
    Gerard Peter Kuiper, pela mesma época, sugeriu a existência de um anel de blocos de gelo sujo em torno do Sistema Solar, porém muito mais perto deste do que a nuvem de Oort (cerca de 35 UA a 45 UA). Esse anel, que passou a ser conhecido como cinturão de Kuiper, fica além da órbita de Plutão e também foi apresentado como berçário de cometas, especialmente os de curto período, entre eles o de Halley. David Jewitt e Jane Luu recentemente descreveram um objeto, o 1992 QB1, provável asteróide que comprovaria a existência do cinturão.
    Por meio de uma grande simulação computadorizada, Harold Levinson e Martin Duncan estudaram o distante cinturão, que tem sido alvo de muita especulação há uns cinco anos. Eles calcularam como as órbitas dos objetos no cinturão de Kuiper poderiam ser perturbadas pela influência gravitacional de Netuno ou de seu vizinho Urano. Cabe lembrar que Plutão nem sempre aparece como o último planeta em relação ao Sol, porque peculiaridades de sua órbita fazem que ele às vezes seja ultrapassado por Netuno (assim ocorreu entre 1997 e 1998). O estudo dos dois astrônomos sugere que o cinturão pode ser a origem de todos os cometas de curto período (menos de 200 anos) que penetram na parte mais interna do Sistema Solar.

    Levinson e Duncan submeteram seu estudo a vários testes com alegado êxito. Deduziram que o cinturão de Kuiper tem estrutura intricada e possui duas faixas de órbitas estáveis, nas quais os objetos podem permanecer por muito tempo, mas acabam saltando abruptamente numa órbita que cruza a de Netuno, e então se dirigem para o Sol. O objeto 1992 QB1 parece descrever órbita quase circular, a 41 UA do Sol, situando-se numa das zonas estáveis previstas no estudo ("Astrophysical Journal", 406 L35).
    Vários outros berçários de cometas têm sido propostos, inclusive no interior do Sistema Solar. Aliás, por Sistema Solar se deve entender todo o conjunto de estruturas referidas, inclusive o cinturão e a nuvem de Oort. A confirmação dessas últimas formações poderá responder a uma velha questão: onde termina o Sistema Solar? Muitos responderiam: em Plutão, que é o último dos planetas. Outros responderiam: em Netuno, porque, como já dissemos, sua órbita em certas circunstâncias excede a de Plutão. Mas em vista das últimas descobertas, talvez seja mais certo responder que o ponto final esteja ou no cinturão de Kuiper ou na nuvem de Oort. Seja lá como for, essas duas estruturas fazem parte do Sistema.